segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Palestra PAE: O conhecimento como questão - o papel da epistemologia na formação superior

Salvador Dalí, "Galatéia das estrelas" (1952).
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A terceira palestra do PAE que publicarei em forma de postagem é O conhecimento como questão - o papel da epistemologia na formação superior, ministrada pela Profa. Dra. Sara Albieri, em 17 de novembro de 2010.
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O objetivo desta palestra é o de identificar o papel da epistemologia na graduação. Assim, a Profa. Sara Albieri inicia com a caracterização segundo a qual o ensino se separou em áreas, departamentos e disciplinas, afirmando que este fenômeno não é exclusivamente brasileiro. Há certa estranheza na forma de conceber a atividade, ocasionado pelo isolamento entre os departamentos o que ocorre mesmo nas humanidades. Originalmente, universidade estava relacionada com a universalidade, mas atualmente encontra percebe-se mais o elemento da especialização.
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Quanto ao elemento da interdisciplinaridade, a Profa. Albieri afirma que ela só é possível onde já há disciplinas estabelecidas, mas isso leva a questão de como fazer com que elas se comuniquem entre si. Aponta que mesmo as pesquisas de pós-graduação, quando propõem questões que levem ao cruzamento de fronteiras este é indesejado. O vago e genérico, porém, pode conter grandes questões que acabam não sendo tratadas na universidade. Historicamente, o papel desta conexão seria da filosofia. No século XVII houve migração para áreas. Na sua origem grega, Aristóteles se ocupava de diferentes assuntos, mas sua investigação era uma busca da verdade, diferenciando-se das questões práticas. A filosofia, assim, se atém ao inútil, no sentido de que não está ligada a utilidades práticas (presentes ou futuras) e que pode ser considerada uma marca distintiva de busca mais profunda.
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Até o século XVIII “filósofo” designava várias áreas, tal como a filosofia natural. Neste período, os termos filósofo e cientista não se diferenciavam, sendo, portanto, intercambiáveis. Não é o assunto que define, mas o modo como se aborda a investigação. Com os departamentos, conclui-se que o que os filósofos fazem é história da filosofia. Dando a impressão de que a filosofia se reduz à reconstrução do seu passado.
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A Profa. Albieri sugere uma revivência do modo como se trata a filosofia no Brasil, pois no exterior normalmente os estudos não se concentram em autores, e sim em áreas do conhecimento, não fazendo apenas a exegese, mas também transporta questões tratadas para o presente, discutindo questões tal como grandes autores já o fizeram. Estudam-se problemas e não autores, podendo ultrapassar limites de autores e de épocas a fim de explorar uma questão.
A seguir, Profa. Albieri afirma que tratará do problema da epistemologia na formação superior partindo desta perspectiva de problemas. Epistemologia, nome contemporâneo para teoria do conhecimento, era pensada com a perspectiva de que seria possível conhecer cientificamente o conhecimento, porém a teoria do conhecimento é anterior a esta cientifização. Primeiramente, tratava de estudo dos argumentos, sendo que a construção de qualquer teoria dependeria dos preceitos da boa epistemologia (arte de construir as estruturas). Como se o modo de produção de conhecimento pudesse ser estabelecido. Além dos que se apoiavam em lógica e em argumentos, havia os que se apoiavam na teoria cognitiva (condições de pensamento enquanto espécie). Assim, a epistemologia pode ser compreendida como fundamentação racional e, neste sentido, está relacionada à lógica e à epistemologia filosófica. Ou ainda ser compreendida como fundada na natureza humana, estando assim ligada ao organismo e às operações cognitivas.
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Estes dois caminhos continua tendo adeptos. A naturalização, por exemplo, está relacionada aos filósofos da mente, neurociência, relação mente-cérebro. Sendo que os que consideram a fudamentação racional estão ligados à lógica e à epistemologia filosófica (readotando o termo Teoria do conhecimento). Passa para a questão de como produzir conhecimento ainda interdisciplinar em sua essência:
- No ensino de graduação: a escolha do curso, já leva a especialidade. Mas, o excesso de especialização leva a danos (apesar de esta relação ser um pouco diferente no caso de alunos que já estão fazendo segundo curso universitário). Ideia de formação disvirtuada desde o ensino médio, sendo que na preparação para o vestibular já é voltado para questões práticas. Nem o ensino particular, nem o público cumprem com o aspecto da formação. Aluno que entra desta forma no ensino superior poderia resgatar a formação através do estudo da epistemologia.
- Epistemologia: aluno foi ensinado a ser um tecnicista (pragmático, eficiente), mas nem sempre foi estimulado ao pensamento crítico. Normalmente, o aluno tende a conversão dogmática para outras teorias, mesmo que críticas, pois continua não pensando criticamente por conta própria, o que o torna um conformista, no sentido de adequado ao grupo. Seria necessário que a epistemologia oferecesse as ferramentas necessárias para que o aluno pense por conta própria e não os resultados.
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Sendo assim, Profa. Albieri considera que não devemos adotar logo a crítica que é feita por terceiros, pois a relação de ensino funciona de modo mais eficiente aprimorando as formas de pensar, como os discursos se apresentam como verdadeiros e como argumentam neste sentido. É preciso aprender a formular boas perguntas, reconhecer a estrutura do argumento, colocando a discussão em base mais sólida e sadia. Também faz parte da formação acadêmica aprender a expor as ideias em apresentações públicas, escrever trabalhos, sem se concentrar tanto nas ideias dos autores através de fichamentos. Concluindo, apresenta a epistemologia como proposta de solução, desde que seja adotada nos diferentes cursos como disciplina obrigatória, já que ela perpassa todas as áreas acadêmicas, levando à perspectiva do conhecimento como problema a ser estudado.

Um comentário:

Pres. David Naylor disse...

Você anunciou seu objetivo como o de registro da palestra. Eu, contudo, gostaria de saber da sua avaliação crítica sobre o conteúdo dela. Será que ela estava falando mesmo da epistemologia em especial, ou da filosofia de modo geral? E será que ainda faz sentido assinalar à filosofia esse papel de matriz e de juíza dos conhecimentos existentes e possíveis? Gostaria de saber a sua posição.